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| 4# Água salgada

  • thenutsbook
  • 19 de jul. de 2020
  • 5 min de leitura

A cartinha desta semana tem dedicatória. No primeiro dia, do primeiro ano da faculdade, o universo ofereceu-me os dois melhores colegas de laboratório que podia ter pedido. Tornámo-nos inseparáveis e continuámos assim durante bastante tempo. Muita coisa mudou desde então mas, um deles manteve-se sempre como um excelente botão de pânico. Não que o tenha acionado muitas vezes mas há pouca coisa mais reconfortante do que saber que ele está ali, algures, do outro lado de uma linha telefónica, a bebericar qualquer coisa francamente questionável. E com um copo guardado para mim.


Mas há mais outra coisa fantástica sobre ele. Há quem conte com o Spotify para descobrir música nova. Quem confie cegamente nos seus algoritmos. O meu algoritmo é de carne e osso; e desde os dias em que passávamos o tempo que faltava para as aulas de Microbiologia a cantar Imagine Dragons no piso 6, que as nossas mensagens se parecem mais com playlists.


A semana passada, tive uma manhã difícil. Daquelas em que coisas como subir as escadas do metro parecem as tarefas mais difíceis deste planeta. Daquelas sobre as quais evito escrever. E foi precisamente à espera do metro que abri a primeira faixa da playlist da semana. Nada mau para alguém cuja presença numa discoteca se assemelha a uma passagem do cometa Halley. Tex, por tua culpa, dancei na plataforma do metro, na semana passada. E isso merecia uma mençãozinha honrosa. A ti e aos senhores que cantam aquilo de:


Your eyes, they shine so bright

I want to save their light

I can't escape this now

Unless you show me how


Para nos lembrarmos todos das pessoas maravilhosas que nos fazem dançar.


A verdade é que já não escrevia uma destas há algum tempo. Mas tenho um justificação perfeitamente válida. Eu. No outro dia, li, maravilhada, sobre a necessidade de nos autocolocarmos em modo avião e marcarmos um encontro connosco próprios. A expressão “appointment with myself” fica bem mais bonita, mas na prática é disso que se trata. O que aconteceu foi que fiz uma “marcação” e acabei por ficar com uns 10 textos na caixa de saída; e muitos deles tinham prioridade face a esta listinha de coisas que conservaram a minha sanidade nos últimos dias. Mas estamos aqui agora e isso é tudo o que importa.


-> Começamos pelo Rob Walker, que é o autor desta reflexão e que fala sobre ela (e sobre o livro que lançou no ano passado) aqui.


-> Falando em encontros que não descuramos nunca, por mais fugazes que sejam, confesso que perdi uns 50 minutos do meu dia a contemplar este "Estudo da almofada". Dei por mim a pensar se haveria alguém disposto a inventar generalidades apelativas sobre o nosso futuro com base nos vincos que lá deixamos a cada manhã. Assim como quem lê palmas das mãos, borras do café… haverá algo mais íntimo, mais revelador que o produto físico dos tumultos da noite passada? Deixo isso convosco.


-> Esta semana também escrevi sobre expectativas. Coincidentemente, acabei por me cruzar com uma entrevista… peculiar. ASK A SANE PERSON: JIA TOLENTINO ON PRACTICING THE DISCIPLINE OF HOPE onde a autora fala da esperança na humanidade e no mundo como se de um exercício de autodisciplina se tratasse. Quase de estoicismo. E se calhar é mesmo. De tudo o que se pode ler, fico-me com isto: " I try to expect nothing and hope that everything is possible. I want the courage to need very little and demand a lot."


-> Enquanto o estado das coisas não nos permitir grandes exigências universais, esta semana fiz outra descoberta maravilhosa. O Window Swap tem um nome que diz tudo. Qualquer pessoa pode submeter um video da paisagem captada desde a sua janela e submetê-lo, criando assim um plataforma que nos permite saltitar por todo o mundo… uma janela de cada vez. Em tempos de quarentena e isolamento já ninguém tem de se contentar apenas com o que vê do seu próprio canto do mundo. E isso é maravilhoso.


-> Os últimos meses provocaram uma acumulação considerável na minha lista de "Sitios em Lisboa para experimentar". Quem leu a minha euforia sobre a Letreiro Galeria percebe o entusiasmo que o Guest Collective me trouxe. Em vez  de críticas aos espaços, contam-se os momentos neles vividos. Se tudo o que escrevo tem um comboio, um café, um bar ou um cinema de fundo, mal posso esperar por ler sobre as histórias especiais de que fazem parte os sítios onde também construo as minhas.


Momento Covid19


E pronto, foi assim que me rendi ao facto de que isto existe e domina grande parte dos nossos dias. Portanto, mais vale dar-lhe um pouco de tempo de antena cronometrado e esquecer a coisa.


-> O "How To Listen To Jazz" de Ted Gioia foi o livro que me fez companhia durante o meu intercâmbio, naquele Verão de 2018 em que Salzburgo chegou aos 31 graus e as ventoinhas esgotadas fizeram capa de jornal austríaco. Fui tão feliz dentro daquelas páginas que é quase um crime trazê-las para aqui. Só que ontem li um editorial que citava uma passagem que não recordava: "Estranho como possa parecer, as novas formas de arte são semelhantes à peste ou a uma gripe virulenta, no modo como se propagam. A arte e a doença proliferam via contágio e vêem-se ambas favorecidas por condições similares. Elevada densidade populacional, chegada e partida de um grande número de indivíduos… uma cultura e uma atmosfera que enfatizam as atividades comunitárias e as reuniões sociais - estas condições são simultaneamente um pesadelo para quem pretende travar uma pandemia e os ingredientes de que são feitas as revoluções artísticas que mudam o mundo." O Jazz em Nova Orleães, depois da gripe de 1918. O Renascimento em Itália, depois da peste negra. A peça termina com uma reflexão sobre a origem comum das palavras "influência" e "influenza". E eu terminei com uma enorme vontade de descobrir o que vamos inventar depois disto.


-> Esta explicação interativa sobre porque é que o tempo nos parece tão estranho desde o início da pandemia reconciliou-me com o meu estado mental e convenceu-me de que não estou a ficar maluca. Para já.


Pedaços de Internet que me fizeram sentir coisas


-> Ver esta fotografia fez-me pensar que há dois tipos de pessoas neste mundo. As que se identificam com o pai e as que se sentem o miúdo. Segunda opção, sem dúvida. Atiraram-me para aqui e ainda estou meio perdida.


-> Às vezes, o que nós sentimos não passa de um carga de trabalhos para outra pessoa. Pronto, está bem, esta não vem da internet. Saiu-me em conversa e fiquei três horas a olhar para o tecto nessa noite, antes de adormecer. Tomem, passo a maldição para vocês.


-> O Tiago é um colega de faculdade que, além de ser uma pessoa fantástica, tem uma esposa linda e dois filhos que fazem as fotografias mais fofas deste planeta. O Tiago também é um dos meus feministas preferidos e quando leu a minha Distância de Segurança enviou-me isto. Cá estaremos os dois, para fazer barulho sobre coisas que importam, enquanto assim for preciso.


A Imagem Fofinha


Esta ilustradora española foi a Monsanto e fez isto. Espero que vos faça sorrir.


O lema para os próximos dias


Depois da ode ao coração partido que volta a colar-se, a conclusão evidente de cada verão:


"A cura para tudo é sempre a água salgada: o suor, as lágrimas ou o mar"

Memorias de Africa, Karen Blixen


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nozes que juntam palavras

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