Não acho que tenha escolhido uma altura particularmente agitada para vir até aqui porque duvido que este quadradinho entre rios tenha vivido um único dia livre de frémito, pelo menos, na sua história recente. Neste caso, tive a pontaria de acertar em plena Semana da Moda, chegar no dia do debate presidencial e ficar durante as escassas horas em que decorreram acontecimentos tão díspares como as celebrações do 11 de Setembro, os VMAs e a Assembleia Geral da ONU. Manhattan tem 59 km2 e 1 600 000 habitantes, fui verificar. Areias, a aldeia dos meus bisavós tem 40km2 e nela vivem 1500 pessoas.
Sentada na cama, à espera do debate, penso na nossa casinha, fechada, à espera. Na fruta do pomar que ficou por apanhar. Aquelas árvores existem ao mesmo tempo - algumas há mais tempo - do que estes arranha-céus e sabê-lo, saber-me num mundo com espaço e lugar para as duas coisas e para mim no meio delas é uma ideia que me deixa mais perplexa e fascinada do que a funcionária de ontem, confrontada com o exótico conceito de museu. Não é só o aeroporto. O mundo inteiro mereceria que andássemos todos de caneta na mão, calados e de olhos bem abertos. Talvez isso nos tornasse melhores pessoas.
Sobre o debate, é difícil escrever. Tanta tinta tonta será derramada por isto nos próximos dias, não sei se a minha estupefação plasmada em texto acrescenta alguma coisa.
Só sei que deviam ser umas dez da noite quando um dos candidatos ao cargo que ainda vamos considerando, embora cada vez menos, como o de líder do mundo livre, acusou uma comunidade emigrante de comer os cães e gatos da população residente. Ora aí está uma sequência de palavras que nunca pensei elencar, pelo menos, formando uma frase coerente. Mas o mundo em que vivemos é um desafio constante à imaginação e mais perigosamente, à própria coerência. Amadurecemos já, para além do optimismo ingénuo com que costumávamos, subestimadamente, encarar este tipo de figuras. E embora nada do que está a ser dito desde o início do debate seja uma surpresa desenquadrada de tudo o que já conhecíamos, nem tão pouco se possa dizer que não existe uma alternativa, a desolação que se instala cá dentro é inevitável e sai em bom inglês americano: is this all we got?
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