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Bagagem



Quando dizemos que todos somos machistas, não estamos a fazer uma generalização intolerável. Queremos dizer que o diferencial entre os direitos dos dois grupos está tão interiorizado na nossa sociedade que qualquer dos seus membros é passível de ter uma atitude machista sem se aperceber.


Está em todo o lado e cabe a cada um de nós fazer o esforço de nivelar a balança, começando por admitir que ela está torta.


Torta, como disse, até à mais pequena molécula. E como este sítio passa muito pelas moléculas que me afligem, hoje vamos falar do meu trauma com malas de senhora.


Vou optar por não entrar na questão de se as roupas devem ou não ter um género. Primeiro, é um campo de minas e segundo, terminamos sempre por perder-nos na semântica.


Encontrar uma mala de trabalho de jeito é para mim uma coisa mais difícil do que escolher entre dois tons de vermelho. E confesso que o motivo não é a falta de oferta ou o patriarcado. O motivo verdadeiro é que sou uma esquisita. Ponto final. O material, o espaço, o corte, o valha-me-Deus-haja-paciência.


No outro dia, acabei por encontrar uma daquelas lojas de marroquineria à antiga, mas online. Como se não houvesse provas documentais suficientes de que tenho o cérebro de um senhor de 70 anos. Vou direta à secção de homem como faço sempre em lojas do género. Nunca parei para me perguntar porquê. Não vi o desnível da balança. Mas depois de me ter decidido por uma das 500 opções de malas e pastas grandes, espaçosas, com os seus compartimentos para portáteis e canetas e - no mínimo - 5 maneiras diferentes de colocar as alças, por mera curiosidade, fui espreitar a coleção de mulher. Ah… já me lembro porquê. À minha frente, no ecrã, 500 opções de malas também. Muito bonitas. Pochetes, de ombro, à tiracolo. Uma que outra mochila. 0 pastas de trabalho. Uma ou duas com compartimento para portátil onde naturalmente não cabe mais nada.


Claro. Até há bem pouco tempo, o mercado laboral pertencia aos homens, sobretudo, o do trabalho diferenciado. A nós cabia-nos, no máximo, a pochete. Afinal de contas, de que é que uma mulher pode precisar? O seu baton, o seu espelhinho… pouco mais não é? Era. E todos sabemos disso mas há imensos exemplos por toda a indústria que comprovam que esta ainda não se alinhou com a realidade. Claro que existem malas maiores mas a grande maioria têm formatos de quase saco de compras (a outra atividade que se assume que vamos fazer). Nada contra a sua existência mas a realidade é que continua a não haver uma oferta semelhante à que existe para homens no que toca a quem trabalha. Como em quase tudo, chegámo-nos à frente e começámos a resolver o problema. Foi há 3 anos que nasceu a "Josefinas" uma das primeiras de muitas marcas que fazem coisas tão surpreendentes como incluir um compartimento para computador nos sacos de higiene dos bebés. Porque esta é a vida não é? A vida real. Continuemos a separar a moda em género, se nos apetecer ou se as palavras fizerem referência ao estilo das peças e significarem tanto como vintage ou retro. Mas que vejamos cada vez mais espaço para fraldas também nas pastas dos homens… e equipamento de trabalho que nos sirva a todos. Porque todos desempenhamos bem mais do que um papel.

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