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O que é que eu quero?



Sempre invejei aquelas pessoas que encontram dinheiro no fundo da mala; por entre as almofadas do sofá; no bolso das calças. Pronto, está bem, eu não possuo calças, uma vez que só uso peças de roupa acima do joelho. Mas tenho malas! E até tenho sofás. E em 25 anos de existência nunca um cêntimo perdido foi parar às minhas mãos despidas e desamparadas, quanto mais as notas de 10 euros que as minhas amigas costumavam desenterrar dos infernos dantescos de que são forradas as malas de senhora.


No outro dia, o Universo resolveu contrabalançar esta escassez de descobertas valiosas e eu própria, qual Indiana Jones agraciada pelo além, desenterrei com as referidas mãos nuas, qualquer coisa das profundezas do meu próprio inferno de pele revestida. Não era uma nota, obviamente, isso era Universo a mais. Era uma lista.


Gosto de escrever muito para além destas histórias. De uma maneira geral, pôr as coisas no papel sempre foi a minha maneira de organizar o mundo, de navegar águas complicadas, de tourear a vida inteira. É por isso que adoro listas, mais ou menos de tudo.


A folhinha em papel que resgatei, coberta daquela areia sahariana que formam as migalhas das bolachas perdidas, algum disco de maquilhagem solto e o que sobrou daquele papel de rebuçado que eu ia deitar fora há 3 anos atrás - só podia ser uma lista. E no cabeçalho podia ler-se, em garrafais letras vermelhas: o que é que eu quero? 2019.


Dois anos se passaram desde que aquela foi rascunhada mas há imensos exemplares semelhantes circulando nomadamente pelos meus bens pessoais. Dos meus anos no associativismo, ficou-me como certa a noção de que a informação é poder... de mão dada com a intuição de que a fonte mais complicada de entrevistar somos nós próprios. Ficou-me também que o carro que conduzimos tem uma direção que não tem sempre de ser a mesma e um travão que também não está sempre no mesmo sítio. Que é preciso tirar tempo, pouco mas constante, para ler os sinais e perceber onde se encontram ambas as coisas. Como podemos manter-nos na primeira e evitar o último.


É isso que faço com estes papéis, ferramentas extremamente úteis para garantir um certo alinhamento interior em cada momento vital mas que utilizo conforme a necessidade e por isso - graças a Deus - sem demasiada frequência. Nunca me passou pela cabeça olhar para trás. Mas ao encontrar um momento de há dois anos atrás lá teve de ser, não é? Li o que lá estava escrito. Ri, chorei e voltei a rir. Pelos motivos previsíveis. Algumas coisas que pesavam o mundo naquele momento, hoje parecem tontas, preocupações que - como sempre acontece com quem já conhece o final da história - se afiguram como desnecessárias. Outras eram, naquele momento e com toda a propriedade, o propósito da minha vida. Quase todas, no entanto, tiveram o destino final e merecido de qualquer tópico listado deste mundo. A maior glória de todas. Um certinho à frente.


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