A história de hoje estava no tinteiro há algum tempo. Tem quase 100 anos e parecia-me demasiado triste para desbravar sem um contexto. Mas a realidade ofereceu-me um esta semana, com tudo o que se está a passar no Afeganistão.
Das muitas mensagens que os prisioneiros da ditadura franquista enviavam aos familiares, recuperou-se uma que nunca mais me saiu da cabeça, desde que a li: "Pais: levam-me para me matarem e vou muito tranquilo." Pensei em como devia ser difícil conservar a dignidade, estando mergulhado num mar de terror. Que dom seria, dentro da desgraça, partir deste mundo em paz com ele, por mais injusto e cruel que pudesse ter sido com aquele que parte.
Na semana passada, ouvi o Almirante Gouveia e Melo dizer que tínhamos de assumir as consequências daquilo em que acreditamos e uns dias mais tarde, a entrevista da primeira mulher Presidente de Câmara do Afeganistão (Zarifa Ghafari é o nome dela). Parece incrível mas as mulheres já estavam a começar - lentíssimamente - a ocupar cargos políticos. E quase a mesma frase desoladora "Estou sentada, à espera que venham matar-me".
Os sítios onde nascemos tendem a ter um papel importante sobre a severidade das consequências que enfrentamos por sermos quem somos. Não podendo igualar a coragem dela e de todas as outras, nem conseguindo sequer imaginar o sofrimento e a opressão que se vivem aqui ao lado, penso nelas hoje. E agradeço a todos os santinhos a sorte que tive.
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