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Quebra-Nozes | 6# A cor do amanhã

  • thenutsbook
  • 26 de jul. de 2020
  • 1 min de leitura

Há uns 20 anos atrás, uma mulher negra e uma mulher branca assistiam embevecidas à aula de ballet das filhas que iam deslizando - ou, deverei dizer, tropeçando - pelas tábuas de madeira daquele colégio velhinho, apoiadas em 4 sapatilhas de ballet perfeitas... para os pézinhos da aluna branca, claro. A primeira coleção de sapatilhas a oferecer um modelo para as mulheres negras data de 2019. Sim, tem menos de um ano.


Até então, todas as bailarinas negras eram obrigadas a pintar o seu principal instrumento de trabalho de forma manual. Mas naquele dia em particular, a conversa não era sobre isso. A mulher branca contava a sua bela manhã - perdida - como são quase todas aquelas que passamos na fila do banco:


- A senhora acredita nisto?! - dizia ela. - O funcionário perguntou porque é que era eu a 1ª titular da conta e não o meu marido. Só porque sou mulher.


- Nem me diga nada. Hoje, quando cheguei ao consultório, fui à máquina do café antes de vestir a bata. A mulher que estava atrás de mim vê-me e diz-me: "Então?! A tomar um café antes de começar a limpar, enquanto a patroa não chega, não é?" Como sou negra, não posso ser veterinária, só posso fazer limpezas.


A minha amiga e eu dançámos muitas tardes depois dessa. Para fora da sala, do colégio, da cidade. Perdemos o contacto. Mas hoje, quando a memória dela volta até mim, embalada pelos acontecimentos que temos vivido, pergunto-me se algum dia a encontrarei, sentada num banco numa sala de ballet, a ver a filha rodopiar sobre umas sapatilhas per-fei-tas... para ela.

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