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Send Me Love



Estou a correr para o comboio. Faltam 5 minutos, estamos bem. Hora de abrir o rebuçado que tinha guardado para esta hora. Duas mensagens propositadamente pendentes. É uma mania que tenho mas os amigos são um bocado como comprimidos. Têm outras funções mas uma delas é tratar coisas em nós, coisas que às vezes nem sabíamos que precisavam de tratamento.


São dois links do Youtube enviados aleatoriamente como sempre. Em seis minutos de música, um dos meus melhores amigos saltou do telefone, pegou na minha mochila, como fazia sempre durante a faculdade e levou-me até ao comboio, mesmo até ao fecho da porta. Também me recordou das saudades que tenho dele e de uma notícia que ouvi e que guardei na memória para partilhar convosco. Mas lá chegaremos.


Dou por mim a pensar quando voltaremos a poder abraçar-nos ou beijar-nos sem restrições. Logo eu que costumava andar sempre colada às pessoas. Logo nós, filhos de nações tão propensas a ver com as mãos.


Lá para o fim da faculdade comecei a questionar a natureza dos abraços que dava, do contacto físico tão próximo de toda a gente. Quando o curso acabou, compreendi que fazia parte de um enorme espectáculo de fogo de artifício… brilhante, vistoso, colorido, bonito de se ver… mas sem grande conteúdo.


A pandemia funcionou como um filtro fantástico. "Que saudades de te abraçar" respondi eu ao meu DJ residente. E era verdade. Varreram-se as luzes todas e por entre a poeira de todo o caos ficaram de pé duas mãos cheias de pessoas que morro por abraçar. Por apertar com força contra mim e que, até lá, irão manter-me viva à distância.


O último ano desvendou-me múltiplas formas de suporte de órgão à distância, que costumam partilhar convosco na #pilares. Ainda assim, quero acreditar que estamos a tornar-nos mais exigentes. Originais, no mínimo.


O Théâtre de la Ville, em Paris, criou um programa de teleconsulta poética. Gratuita. Qualquer pessoa pode agendar uma chamada telefónica com um actor, que lhe faz algumas perguntas (a primeira é sempre "Como estás?"). Considerando as respostas, declama um poema que escolhe naquele momento.


Achei a ideia mágica. Uma oportunidade de criar uma ligação humana real que a distância não tornasse menos verdadeira. Talvez fosse disso que sempre andámos à procura. Ironicamente, no mês em que a pandemia explodiu em todo o mundo, um dos projetos mais originais que conheci dava por concluída a sua missão. O Send Me SFMOMA, foi o chatbot criado pelo San Francisco Museum of Modern Art com o objetivo de tornar a sua coleção mais acessível ao grande público, baseado numa interação muito simples. A pessoa enviava uma palavra ou um emoji via SMS e recebia uma fotografia de uma das obras do museu. O pedido número 1? Adivinharam. Mais de 190 000 pessoas escreveram Send Me Love.

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